O estudante Fellipe Camargo, de 20 anos, admite que nunca foi da turma dos “quietinhos”. Mas, se na escola os professores reclamavam de suas conversas paralelas durante as aulas, na universidade elas são incentivadas e ele é visto como “comunicativo”. Falar bem virou uma habilidade tão valorizada no mercado que algumas faculdades da capital adotaram provas orais em seus processos seletivos e focam no aperfeiçoamento da capacidade verbal durante a formação universitária do aluno.
A ideia central dessa valorização da oratória é que o estudante chegue ao mercado como um profissional minimamente articulado. Nos vestibulares que cobram a oralidade, por exemplo, o conceito é mais amplo que uma simples “chamada oral”.
“Buscamos mapear o universo de aptidão do candidato. O discurso oral não tem respostas corretas. Fazemos uma entrevista”, diz Anália Amorim, presidente da Associação da Escola da Cidade, faculdade de arquitetura e urbanismo que analisa o quanto seus vestibulandos são articulados.
Mesmo após descobrir que a prova oral da Escola da Cidade não era critério de corte no vestibular, Fellipe Camargo ainda manteve o receio em relação ao formato da avaliação. “Fiquei surpreso. Imaginei que eles fariam perguntas específicas sobre arquitetura ou urbanismo”, diz o universitário, que cursa o segundo ano de arquitetura.
Tímido, o advogado Daniel Tavela Luís, de 23 anos, conta que recorreu a “aulas específicas” para evitar surpresas na segunda fase do vestibular para Direito na Fundação Getúlio Vargas (FGV), outra instituição que cobra a oratória. “Sabia que seria assim (prova oral) e me preparei. Desenvolvi a habilidade no colégio. Falar envolve conteúdo e domínio em habilidades de comunicação”, diz o advogado, formado em 2009.
“Avaliamos a argumentação, contextualização, raciocínio, conhecimentos gerais e a capacidade de ouvir dos candidatos”, diz Adriana de Faria, coordenadora do curso de Direito da FGV-SP.
Desenvolver a habilidade verbal é uma meta educativa, de acordo com a professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Silvia Colello. “Mas as escolas sempre privilegiaram a língua escrita e não a falada, numa valorização do silêncio”, diz.
Em alguns colégios da cidade, a oralidade é desenvolvida desde os anos iniciais. “Insuflamos debates para desenvolver argumentação e senso crítico”, diz o diretor do Colégio Vértice, Adilson Garcia. No Dante Alighieri, são comuns debates e seminários. “Assim, alunos são capazes de dialogar sem reproduzir pontos de vista de terceiros”, diz o diretor da instituição, Lauro Spaggiari.
Dicas de um especialista:
Professor em comunicação e autor de livros sobre expressão verbal, Reinaldo Polito listou, a pedido do JT, orientações para ajudar o aluno a falar em público:
- Não tente falar em público de maneira diferente. “Mantenha a naturalidade. Imagine uma conversa entre amigos”, diz o professor
- Demonstre envolvimento na conversa e com o tema que está sendo discutido
- Evite gírias e vícios de linguagens. “São erros que devem ser eliminados do vocabulário com o tempo. Não espere uma prova para tentar corrigi-los”
- Aprenda a completar a informação. “Todo raciocínio deve ter começo, meio e fim. Não deixe que o ouvinte conclua o seu raciocínio”
- Fale com um bom tom de voz, equilibrado. Não grite, nem fale muito baixo. “Alto demais, pode parecer ansiedade. Muito baixo, pode parecer timidez”
- Alterne o ritmo de sua fala. “Candência dá ritmo e estrutura melhor o raciocínio”
- Use bem as pausas. “Respire e aproveite as pausas entre as frases. Use o silêncio para dar ritmo à fala”
- Evite erros gramaticais. “Eles acabam com o discurso de qualquer um”
- Controle os gestos. “Não gesticule demais, nem fique paralisado. Tente ser o mais natural nos movimentos”
- Mantenha o semblante arejado
Fonte: O Estadão